quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Sobre a visão da alemanha

A traduçao, feita por um dos admin deste blogue, de um artigo da autoria de Hans-Ulrich Jörges na revista alemã Stern.

Hans-Ulrich Jörges, Stern 6.9.2012

É insuportável. A burrice do orgulho nacionalista patente no barulho que envia a nossa razão para a trompeta. As tiradas depreciativas sobre os países do sul, recortadas como confetti para os títulos dos jornais - o sul que aprecia a sesta e só quer o nosso rico dinheiro. O clamor do jornal Frankfurter Allgemeine contra a inflação, que um banqueiro com passaporte falso e genes monetários de romano decadente vai lançar sobre nós. Estamos mergulhados na miséria do euro. A autocompaixão e a fúria tentam apoderar-se da alma alemã.
E que tal se tentássemos tirar a nossa razão da trompeta? Se começássemos a aceitar a Europa e a sua moeda frágil - defendê-la com tudo o que temos, com todos os que estão connosco, e contra todos os que a querem destruir? Se nos despedíssemos do nosso auto centrismo, dos erros e das ilusões que transportamos connosco vindos da era das paixões nacionais, quando o marco alemão funcionava para os alemães como substituto do patriotismo traído?
Começa com a ilusão de sermos os mestres e o modelo da Europa. Sim, foram os alemães que, no início do euro, impuseram aos outros países severos critérios de estabilidade. Mas também fomos nós os primeiros a dar o exemplo, no tempo do chanceler Gerhard Schröder, do impune desrespeito dessas regras. Espalhámos o veneno da dívida pública desordenada, do qual provaram os gregos, e não só. Hoje impomos à Europa poupanças públicas que estrangulam os países, mas nós próprios não poupamos um único cêntimo. Gastamos a rodos, alimentados por generosas fontes fiscais. Se tivéssemos de poupar como os espanhóis, a nossa cómoda partidocracia rebentava.
Além disso, acreditamos que, por termos a economia mais poderosa do continente, nada de importante deve ser decidido à nossa revelia. Por termos as bolsas mais recheadas, concedemo-nos um poder de veto. O que é insustentável. Os outros podem organizar maiorias contra nós - temos de suportar isso.
E temos de ter a superioridade de sermos capazes de reconhecer que os outros podem ter razão. No Banco Central Europeu isso já aconteceu. O presidente do Banco Central Alemão, Jens Weidmann - isolado no conselho do BCE, com apenas um voto, tal como o colega de Malta - agita-se contra a compra de títulos da dívida de Estados em dificuldade, para baixar a pressão dos seus juros. Se fosse ele a mandar, o euro já não existia. Que sorte termos o italiano Mario Draghi à frente do BCE! Defendeu o euro dos ataques de especuladores anglo-americanos, de forma enérgica e criativa. O que é um óptimo motivo para repensarmos os nossos preconceitos sobre os dirigentes que há no Sul.
É também motivo para enterrarmos o mito do Banco Central Alemão. O banco central de uma região cuja moeda está em crise não se pode restringir à luta contra a inflação. Porque, primeiro: apesar da gritaria, nada indica que haja inflação - a desvalorização monetária na Alemanha anda pelos 2%. Segundo: no passado, o Banco Central Alemão também agiu de forma política. Em 1992 e 1993 injectou milhares de milhões para defender o sistema monetário europeu contra ataques especulativos. O então ministro das Finanças, Theo Weigel, recorda que num intervalo de quatro semanas foram entregues em segredo 90 mil milhões de marcos à França, para estabilizar o franco. Desde a crise financeira de 2008, o Banco Central americano já comprou a Washington títulos no valor de mais de 2,3 biliões de dólares.
Podemos, ou melhor, devemos ajudar a suportar as dívidas dos nossos parceiros? Os tratados europeus proíbem-no, mas já o fazemos há muito. Os pacotes de salvação para a Grécia, Espanha, Portugal e Irlanda não são outra coisa. Tal como as compras de títulos pelo Banco Central Europeu, cujo risco é partilhado por todos. O que está correcto. Se formos capazes de quebrar o ciclo de endividamento e de controlar melhor as finanças europeias, podemos até aceitar os Eurobonds (títulos de reembolso da dívida) e mesmo uma isenção da dívida. Nesse caso, sim.
O nosso grande erro consiste em pensar que podemos invadir o mundo inteiro com as nossas exportações, com salários baixos e uma cotação do euro favorável, sem ajudar os europeus que compram os nossos carros e as nossas máquinas. Temos o maior interesse em manter a liquidez dos nossos clientes. O regresso ao marco provocaria uma valorização de cerca de 40% - colapso nas exportações, desemprego de milhões. Os nossos empréstimos de auxílio também estariam perdidos. O marco ficaria mais caro, e tornar-se-ia o nosso castigo.
O euro foi um projecto político, e foi a condição imposta aos alemães para autorizar a reunificação da Alemanha. Hoje é também uma garantia da economia, base do nosso bem-estar. Com a Grécia. A seguir, com a Polónia. E um ano destes com a Turquia de economia emergente.   

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